20 agosto, 2008

Crônicas: Finalmente encontrei Clarice




Não queria incomodar a viagem de vocês, mas eu podia estar matando, eu podia estar roubando, mas estou aqui apenas escrevendo e relatando uma experiencia maravilhosa que tive hoje.

Hoje conheci Clarice.
Já havia sido introduzida a ela antes, na escola, precisamente entre meus 14 e 17 anos.
Clarice, naquela época me trouxe sensações interessantes, e me dispertou muita curiosidade.
Mas nessa idade, ainda mais saída de uma escola de freiras e jogada em uma escola técnica numa turma de 5 meninas e 45 meninos, eu não poderia dizer que tinha inteligência linguística para compreender Clarice.
Apenas gostava dela, como quem gosta de tomar sorvete, algo que você gosta, mas pode facilmente viver sem lembrar por meses.

Aos trinta e tantos, voltei a ouvir falar de Clarice, na verdade eu fui atrás dela, e a encontrei na internet, nos emails recebidos de amigos contendo algo sobre ela. Na verdade, tem sempre alguém por ai falando de Clarice eventualmente.

E depois de tanta informalidade e casualidade, eu e Clarice tivemos nosso primeiro encontro formal. E posso dizer, foi emocionante!!!

Aquele olhar estranho de quem não quer se mostrar, mas é transparente mesmo assim.
Aquele sotaque de quem ama a língua portuguesa, mas que não nega o país de origem e a influência dos muitos países onde morou.
Aquela forma simples de falar, sem docilidade, sem agressivade, apenas assertiva a respeito de si mesma e de seus feitos.
Aquela simplicidade de quem não deve a ninguém se não a si mesma o poder de expressar em palavras escritas toda profundidade de seu ponto de vista.
Aquela escritora que conheci quando eu era uma garota boba, e me apaixonei perdidamente quando me vi mulher.

Clarice Lispector!!!! Eu a conheci no CCBB, ouvi sua voz, vi seu rosto, sua pele queimada depois de um incidente em que ela fumou um cigarro e dormiu, acordando com o apartamento em chamas. Conheci aquela mulher, que viveu um casamento aristocrático, arranjado e triste, mas que se separou, ousadamente. Aquela mulher que viveu uma grande paixão platônica por seu melhor amigo, não correspondida, pelo simples fato de que era gay. Aquela mulher que era bipolar, e que em seus romantes de profunda tristeza, ou de enorme algreia, nos brindou com seus livros, suas crônicas e seus textos.

É dela um texto que tanto gosto,

"Mas há a vida
que é para ser
intensamente vivida, há o amor.

Que tem que ser vivido
até a última gota.
Sem nenhum medo.
Não mata."

e que me inspirou a escrever minha famosa frase "Viver sem paixão é viver sem razão".

é dela o texto que "roubei" e coloquei em meu primeiro livro para falar do casal havia se afastado e brigado. E depois de uma primeira tentativa de "volta" e de uma conversa amena, eles não concretizam a reconciliação, porque foram interrompidos por algum motivo clichê e óbvio para dar emoção a trama, e para romancear meu texto, escrevi que no dia seguinte Pedro Henrique manda entregar um bilhete à Maria Fernanda com o texto de Clarice:

Não te amo mais
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis
Tenho certeza que
Nada foi em vão
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada
Não poderia dizer mais que
Alimento um grande amor
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
Eu te amo!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...

Maria Fernanda chora triste e magoada, mas de repente, percebe que ao final aparece: "leia de baixo para cima". O que parecia o fim era nada mais do que uma bela demonstração de amor.

Bem, sei que meu texto soou bem piegas, melodramatico e mexicano, como um bom livro fase "Sandy"... mas só Clarice poderia ter um texto genial que eu de alguma forma precisava citar em meu livro para homenageá-la.

Mas qualquer coisa que eu escreva ou fale aqui, não fará vocês sentirem o mesmo. Só lendo Clarice, só sendo apresentado a ela como fui é que poderão entender.

Por isso convido vocês a irem visitá-la, lá no CCBB, e a abrirem suas mentes e a vencerem seus preconceitos criados desde os tempos de escola, quando naquela época nos fizeram odiar literatura... Literatura é chato, português mais ainda. Minhas piores notas eram de português, 8, 8.5, sempre detestei provas de literatura, mas isso nunca impediu que eu tirasse 10 em redação, que eu gostasse de escrever meus textos desde nova e muito menos que eu tivesse qualquer bloqueio contra livros... por isso, tenho certeza que Clarice vai intrigar vocês também... com aqueles olhos tão inquietantes...

"Para mergulhar na leitura de Clarice Lispector é preciso um certo preparo psicológico. Com ela não existe meio termo para o leitor. Vencido o primeiro estranhamento não há como se render a sua escrita indefinível (...) Mistura de prosa, confissão, discursos internos e poesia, Clarice sempre soube resolver os nossos mais secretos medos, sempre esteve perto da legião estrangeira que se esconde dentro de nós" (TV Cultura)


http://www.youtube.com/watch?v=TvLrJMGlnF4&feature=related


Raquele absolutamente deslumbrada por Clarice Lispector.

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